terça-feira, 17 de junho de 2008

MOMENTO POÉTICO 19

Na nossa história há pelo menos dois homens notáveis com o nome de João de Deus: S. João de Deus, que é sem dúvida um dos nomes mais extraordinários do nosso passado, embora quase ninguém dele fale, e o poeta João de Deus.
Falemos agora deste último. Ele tem um lugar muito especial na nossa cultura. Quando se discutiam as ideias mais loucas sobre como ensinar as crianças a ler a contar, ele apresentou um livro inovador e de grande sucesso, ajustado ao objectivo em vista, a Cartilha Maternal. O livro da primeira classe por onde aprendi a ler não era a Cartilha Maternal, mas inspirava-se nela. Os contemporâneos de João de Deus tiveram-no em conta de grande poeta.
Vamos ver dele dois poemas. O primeiro intitula-se Deus?

DEUS?

Quem me terá trazido a mim suspenso,
Atónito, alheado… ou a quem devo,
Enfim, dizer que em nada mais me enlevo,
A ninguém mais do coração pertenço?...

Se desço ao vale, ao alcantil me elevo,
Quem é que eu busco, em que será que eu penso?
És tu memória de horizonte imenso
Que me encheu alma dum eterno enlevo?...

Segues-me sempre… e só por ti suspiro!
Vejo-te em tudo… Terra e Céu te esconde!
Nunca te vi… cada vez mais te admiro!

Nunca essa voz à minha voz responde…
E eco fiel até do ar que respiro,
Sinto-te o hálito!... Em minha alma ou onde?


O segundo é uma paráfrase do Pai-nosso. Já tínhamos encontrado outras paráfrases, mas nenhuma desta importante oração evangélica.

PAI-NOSSO

Pai nosso, de todos nós,
Que todos somos irmãos:
A ti erguemos as mãos
E levantamos a voz.

A ti que estás no Céu
E nos lanças com clemência,
Do vasto, estrelado véu
Os olhos da Providência,

Bendito, santificado
Seja o teu nome, Senhor!
Inviolável, sagrado
Na boca do pecador!

E venha a nós o teu Reino!
Acabe a vil cobiça!
Reine o amor, a justiça
Que pregava o Nazareno,

De modo que seja feita
A tua santa vontade,
Sempre a expressão perfeita
Da justiça e da verdade!

Seja feita assim na Terra
Como no Céu, onde habita
Esse cuja mão encerra
A criação infinita!

O pão-nosso nesta lida
De cada dia nos dá…
Hoje, e basta; a luz da vida
Quem sabe o que durará?

E perdoa-nos, Senhor,
As nossas dívidas; sim!
Grandes são, mas é maior
Essa bondade sem fim!

Assim como nós (se é dado
Julgar-nos também credores),
Perdoamos de bom grado
Cá aos nossos devedores.

E não nos deixeis, bom Pai,
Cair nunca em tentação;
Que o homem, por condição,
Sem o teu auxílio cai!

Mas tu que não tens segundo,
Mas tu que não tens igual,
Dá-nos a mão neste mundo,
Senhor, livra-nos do mal!

Eu agora estou a caminhar para o fim do momento poético. Ainda o manterei durante Julho, mas depois acaba. E fica-me pena por não trazer para aqui nenhuma poesia litúrgica recente, porque há-a de muita qualidade. Por isso vou ler umas quadras de Natal que são mais populares que litúrgicas, neste momento em que estamos no solstício do Verão e em que celebramos o nascimento de S. João Baptista. Daqui a seis meses, no solstício do Inverno, celebraremos o Natal do Salvador.

Alegrem-se os céus e a terra

Alegrem-se os céus e a terra,
Cantemos com alegria:
Já nasceu o Deus-Menino,
Filho da Virgem Maria!

Entrai, entrai, pastorinhos,
Por esse portal sagrado,
Vinde adorar o Menino
Numas palhinhas deitado!

Em Belém à meia-noite,
Meia-noite de Natal,
Nasceu Jesus no presépio,
Maravilha sem igual.

Ai, que menino tão belo,
Ai, que graça que tem,
Ai, que tanto se parece
Com a Virgem, sua Mãe!

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